Qualquer processo de seleção envolve geralmente várias fases até se chegar à entrevista final. Desde a fase de aplicação de testes (aptidão, personalidade, etc.), à fase de avaliação grupal, a diferentes tipos de entrevista – técnica, biográfica e comportamental – um processo de seleção implica um afunilamento da amostra até se chegar à fase final que antecede a escolha. Podia-se pensar que, chegando a esta fase derradeira, o “pior já teria passado”. Se o(a) candidato(a) já passou por tantas fases, seria lógico pensar-se que a filtragem já estaria feita e que, portanto, a probabilidade de ocorrer uma surpresa, nesta altura, seria baixa.
Todavia, a nossa experiência enquanto facilitadores de todo este processo diz-nos que um sem número de variáveis pode impactar de forma crítica nesta fase e condicionar o sucesso da mesma. Nas próximas linhas, procurarei debruçar-me sobre a ótica do(a) candidato(a), elencando um conjunto de reflexões que podem potenciar o sucesso nesta fase final.
Tenha bem ciente porque pretende alterar a sua situação profissional e pense a longo prazo
É verdade que hoje em dia, nomeadamente no âmbito de processos de search, são cada vez mais as empresas que proativamente contactam os candidatos e não o movimento contrário. Este atual paradigma levanta inevitavelmente questões associadas à verdadeira motivação para a mudança do(a) candidato(a), que se encontrava confortável até ser desafiado. Convém que esta reflexão seja feita de forma madura e consciente, de forma a evitar desistências “à boca das urnas”, ou seja, na fase da entrevista final ou após a mesma.
É natural que surjam momentos de dúvida ou até contrapropostas que façam hesitar, mas também é importante que quem se candidata tenha presente todo o processo de engagement que se constrói até à fase de entrevista final e perceba se já existe algum tipo de vínculo emocional com o possível novo empregador, sobretudo tendo em conta o que procura para a sua carreira no médio a longo prazo. Acima de tudo, caso tenha em mãos mais que uma proposta, não entre numa lógica de leilão para ver quem dá mais. Acredite que a sua imagem sairá bastante penalizada.
Faça o seu trabalho de casa – estude a empresa para a qual se candidata
Hoje em dia já não existem desculpas para não pesquisar informação sobre as empresas (volume de negócio, áreas de atividade, resultados nos últimos anos, posicionamento no mercado, etc.). Geralmente o empregador que decide sobre a contratação dá grande importância ao conhecimento ou, pelo menos, à curiosidade que um candidato(a) – independentemente do seu nível de senioridade – revela sobre a sua empresa, associando-o à motivação e entusiasmo que sente pela possibilidade de a passar a representar.
Por vezes, quem decide pode até dar mais importância a uma boa pergunta – geralmente reveladora de curiosidade intelectual -, do que a respostas standard e expectáveis às questões colocadas. A demonstração de interesse e motivação (não confundir com desespero) desempenha atualmente um papel muito importante na tomada de decisão final sobre a pessoa a escolher. E em caso de igualdade, acredite que é geralmente o fator extra que ajuda a desempatar.
Faça todos os cálculos prévios sobre o seu package atual vs. expectativas para mudar – e, atenção, não mude a estratégia a meio!
Chegado à fase final, os temas de ajuste entre as expectativas salariais de quem concorre e o enquadramento salarial de quem seleciona já foram endereçados anteriormente. Mas há alturas em que esse tema é, pela primeira vez, abordado na última entrevista. É importante ter bem presente todas as condições atuais (componente base, variável, regalias, etc.) traduzidas em valores brutos, tal como as legítimas expetativas salariais para sustentar a possível mudança.
Mas mais importante ainda é manter-se fiel ao que mencionou em fases anteriores do processo seletivo. Ao longo da minha experiência, já assisti a muitas candidaturas “morrerem na praia” porque se pretendeu aproveitar a fase final para alterar a estratégia e inflacionar as expectativas, deixando todos mal na fotografia, principalmente o próprio candidato.
Procure conhecer melhor a pessoa com quem irá falar
Sem que tal implique que descaracterize a sua abordagem e genuinidade em entrevista, é importante perceber quem é a pessoa com quem irá falar, de forma a poder adaptar-se ao seu interlocutor. Acredito que nesta fase, sempre que envolva uma empresa consultora, também é responsabilidade desta apoiar o(a) candidato(a) final a preparar-se da melhor forma para esse momento decisivo. Inclui-se naquilo a que carinhosamente chamamos de “candidate care” e passa por tentar prepará-lo(a) para este momento final, ajudando a potenciar todas as mais-valias identificadas ao longo do processo de seleção e alavancando o fit com o interlocutor.
De uma forma geral, é importante mencionar que o objetivo de partilhar estes princípios não é fornecer um manual de procedimentos que garante o sucesso numa entrevista final, mas acima de tudo, partilhar algumas sugestões de iniciativas que poderão ajudar a enaltecer as suas mais-valias e garantir que se sinta ainda mais seguro antes de entrar numa fase decisiva e que pode mudar a sua vida.
Miguel Abreu
Director, RAY Human Capital